Amigos,
Todos nós já ouvimos falar, na
época da escola, sobre as teorias Heliocêntrica e Geocêntrica, e sobre as polêmicas
relacionando Galileu à Igreja. Eu já teci breves comentários a respeito, em
alguns textos do blog, mas hoje resolvi comentar mais um pouco. Não pretendo
esgotar o assunto, mas despertar o interesse de vocês. Conforme for o caso, posso
aprofundar o tema depois em outros textos.
Antes de qualquer coisa, para
refrescar a memória, já que os tempos da escola, para alguns, já vão longe...: a
teoria heliocêntrica diz que a Terra e os outros planetas do nosso Sistema
Solar giram em torno do Sol; a Geocêntrica, dizia que a Terra era fixa, e o Sol
e os outros planetas girariam em torno dela. Sabemos hoje que
a Heliocêntrica é a teoria vigente, e corresponde à realidade. Porém – como eu
também havia comentado anteriormente no blog –, os fatos históricos devem ser
avaliados e julgados dentro do contexto em que ocorreram, não à luz do que
sabemos hoje, pois isso não seria justo. Hoje parece banal reconhecer que a
teoria Heliocêntrica é a correta, e soaria ridículo tentar defender a
Geocêntrica... depois de tantas comprovações científicas, e da exploração espacial.
Mas lembremos que, durante muitos
séculos, a teoria Geocêntrica era a vigente. Quando Copérnico, e depois Galileu,
trouxeram à tona uma nova hipótese, a comunidade científica reagiu, de certa
forma. Antes de ser uma questão entre ciência e fé, era uma questão
circunscrita ao próprio âmbito da ciência. Eu já comentei antes também, em
outros textos do blog, que uma nova teoria científica sempre causa uma reação da
comunidade acadêmica, o que é saudável, para preservar a ciência de ideias
fugazes e que possam estar erradas. Uma nova hipótese proposta precisa passar
pelo crivo científico antes de ser mais amplamente aceita.
Lembremos também que o fato de a
Terra girar em torno do Sol, e não o contrário, era uma ideia que contrariava o
próprio senso comum. Cá entre nós, não percebemos a Terra se mover... e durante
muito tempo, não havia instrumentos para explorar melhor a natureza a fim de
detectar algum movimento da Terra. Logo, como os sentidos pareciam indicar uma
Terra fixa, e os corpos celestes (incluindo o Sol) movendo-se no céu, os fatos
pareciam corroborar com a teoria Geocêntrica.
A teoria Geocêntrica foi
associada a Ptolomeu, um astrônomo do século II, apesar de as discussões em
torno do tema datarem de alguns séculos antes de Cristo. A teoria foi sendo “remendada”,
a fim de incluir os fenômenos observados no céu. Acreditava-se que, na
natureza, as formas deveriam ser perfeitas: logo, acreditava-se que o Sol, a Lua
e os planetas fossem esferas perfeitas, e que os corpos celestes descrevessem
trajetórias que seriam círculos perfeitos. Hoje, sabemos que esses são pressupostos
falsos, mas eram as ideias vigentes à época. Logo, criaram a noção de “círculos
dentro de círculos”, onde as órbitas dos corpos celestes seriam formadas por
composições entre diversas órbitas circulares, umas em relação às outras, o que
resultaria nas órbitas mais complexas, por vezes observadas.
Depois de tantos séculos de
teoria Geocêntrica, Copérnico – que, diga-se de passagem, era sacerdote – começou a
pensar na possibilidade de o Sol ocupar o centro do Sistema Solar, e não a
Terra. Isso ocorreu no século XVI. Porém, sua primeira obra, Comentariolus (Pequeno comentário), não
foi publicada. A extensão deste trabalho, De
revolutionibus orbium coelestium (Das revoluções das esferas celestes), foi
finalizada quando ele estava em seu leito de morte...
No início do século XVII, Galileu
usou a luneta para observar o céu. Uma de suas realizações foi trazer à tona
novamente, e defender, a teoria Heliocêntrica de Copérnico. Galileu é
considerado o pai da física, porque introduziu método científico de observação,
com o uso da luneta.
Porém, as Sagradas Escrituras
dizem que a Terra havia sido fixada; logo, achava-se que não seria possível conciliar
uma teoria que descrevesse a Terra em movimento, com a Bíblia. Hoje, a Igreja
sabe que a Bíblia não pode ser usada como fonte de descrições científicas
acerca da criação do mundo ou da vida. As verdades bíblicas são verdades de fé,
não científicas; e estas verdades de fé, conforme sabemos hoje, não estão em
contradição com as verdades científicas. Mas lembremos novamente do contexto
que havia à época... isso não era claro aos homens dos séculos XVI e XVII.
Relacionado ao problema dos Textos
Sagrados, havia a questão da exegese, ou seja, da interpretação da Bíblia. O
mundo vivia os períodos posteriores à reforma protestante, que a Igreja combatia
firmemente com a Contra-reforma. Falando aos católicos, sabemos que a
interpretação da Bíblia envolve o Magistério da Igreja, que faz parte de nossa fé, e que diz
respeito àquela autoridade dada por Cristo aos Apóstolos, dizendo: “Quem vos ouve,
a mim ouve; quem vos rejeita, a mim rejeita; e quem me rejeita, rejeita aquele
que me enviou.” (cf. Lc 10,16). Logo, ouvimos a voz da Igreja, a respeito das
questões de fé, o que significa ouvir e dar assentimento ao próprio Cristo.
Este cuidado a respeito da interpretação da Bíblia foi intensificado pela Igreja,
durante a Contra-reforma.
Neste meio tempo, Galileu – que era
um católico com certo prestígio na Igreja, praticamente com trânsito livre no
Vaticano, amigo de cardeais e do Papa à época –, de forma imprudente resolveu se intrometer
na questão da interpretação dos Textos Sagrados, em relação à passagem que
trata sobre a Terra ser fixa... Advertido pela Igreja a não avançar sobre o
campo da exegese – para o qual ele não estava autorizado –, ele infelizmente não
deu ouvidos e insistiu na questão. Não se tratava mais, aqui, sobre questões
científicas, mas teológicas.
Tal desobediência de Galileu foi
desnecessária, uma vez que o Papa à época, Urbano VIII, havia pedido a Galileu
que escrevesse um texto descrevendo ambas as teorias: Heliocêntrica e
Geocêntrica, detalhando os “prós” e “contras” de cada uma. Obviamente, isso deveria
ser feito de forma imparcial, como um bom texto científico. Porém, Galileu
possuía um temperamento terrível, que o levava a debater assuntos científicos
com seus opositores de forma agressiva, com críticas duras e tentativas de
ridicularizá-los. Ou seja, neste ponto, estava mais para passional... Logo,
Galileu escreveu seu livro, “Diálogo sobre os dois máximos sistemas do mundo
Ptolomaico e Copernicano”, de forma não só parcial, como também ridicularizando
quem era favorável à teoria Geocêntrica... isso acabou por criar problemas com o próprio Papa, e um grande problema para Galileu...
Após passar pela Inquisição, foi
condenado à prisão domiciliar, o que não o impedia de continuar a orientar seus
alunos, por exemplo. Galileu morreu de morte natural, em casa, cercado por sua
filha, que era freira, e por seus alunos, e recebendo os sacramentos!
Logo, amigos, nada de torturas e fogueiras...
Galileu não foi um “mártir” da ciência. Mas infelizmente são coisas desse tipo
o que se propaga por aí... Agora, dizer que Copérnico – que propôs a teoria
Heliocêntrica antes de Galileu defendê-la publicamente – era sacerdote, isso
ninguém diz, ninguém ensina nas escolas... O que? Ter que admitir que um sacerdote
foi o autor da teoria Heliocêntrica? Nem pensar! Admitir que, de um homem do
clero veio a teoria hoje vigente, jamais! Senão, como irão atacar a Igreja?
Dizer que Galileu morreu católico, recebendo os sacramentos? Nem pensar também!
Senão, como irão atacar a Igreja?
Claro, amigos, que houve erros
por parte de homens da Igreja – pelo que o então papa João Paulo II se manifestou,
reconhecendo tais fatos. Mas lembremos: a disputa entre as teorias
Heliocêntrica e Geocêntrica era, antes de ser uma questão com a Igreja, uma
disputa científica, como tantas outras; além disso, lembremos de julgar os
fatos históricos nos devidos contextos...; e ainda, os homens da Igreja não
foram os únicos a errar: Galileu também errou!
Para finalizar, a teoria
Heliocêntrica foi comprovada somente no século XIX, com o uso do Pêndulo de
Foulcault, que mostrou que a Terra não estava parada, mas em movimento.
A Igreja não tem medo da
ciência; sabe que ciência, filosofia e fé são matérias em profundo diálogo,
complementares, porém distintas e que não devem avançar umas sobre os campos de atuação das
outras. Que bom que hoje temos este entendimento, e como é importante propagar
essa maravilha!
Até o próximo texto, com a graça
de Deus!
Neste texto do Blog, eu afirmo que a teoria Heliocêntrica é a correta, enquanto a Geocêntrica não; e que não teria mais sentido um questionamento a este respeito. Consideremos aqui, a busca por um modelo da movimentação dos corpos celestes que compõem o nosso Sistema Solar! Tomei isto por óbvio, dado que à época destas discussões na comunidade acadêmica, o universo conhecido resumia-se ao nosso Sistema Solar. Tempos depois, foi descoberta a existência de nossa galáxia; e mais tarde de outras, e assim sucessivamente. Considerando nossa galáxia, o ponto referencial mais óbvio para descrever sua dinâmica seria o seu próprio centro - ao que tudo indica, composto por um buraco negro. No texto que é continuação deste, eu comento explicitamente no nosso Sistema Solar. Outra observação, é que, em princípio, não há um ponto referencial absoluto; mas adota-se aquele que simplifique mais o modelo, e torne mais óbvios as previsões e o entendimento acerca da dinâmica do sistema em questão.
(Trecho acrescentado em 07/09/2012):
Esta reflexão está baseada, em parte, no seguinte livro:
-
Simon Singh, Big Bang, Editora Record, 2006.
Apesar de este livro, em princípio, não ter qualquer ligação com questões de fé, seu autor expõe, de forma bem interessante, fatos sobre Copérnico, e que rondaram a elaboração de seus escritos.
Este texto tem como base também alguns episódios do programa Escola da Fé, de Felipe Aquino, na Canção Nova, – programa que também tem um blog associado.
Apesar de este livro, em princípio, não ter qualquer ligação com questões de fé, seu autor expõe, de forma bem interessante, fatos sobre Copérnico, e que rondaram a elaboração de seus escritos.
Este texto tem como base também alguns episódios do programa Escola da Fé, de Felipe Aquino, na Canção Nova, – programa que também tem um blog associado.
isso é muito legal e interessante pois ajuda muito a relembrar os tempos de escola
ResponderExcluirRealmente, nos ajuda a lembrar, e a esclarecer melhor o que muitas vezes não nos era explicado, como o fato de que há muito diálogo favorável entre ciência e religião.
Excluirna minha escola vai ter um debate heliocentrismo vs geocentrismo eu to do lado do geocentrismo como posso derruba a teoria deles e defender a minha?
ExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ExcluirOlá, você que vai ter que defender o geocentrismo em um debate na escola. Veja bem, derrubar a teoria heliocêntrica, você não vai conseguir... ao final do debate, ela deve ganhar, afinal, é a teoria que vale atualmente para explicar os movimentos dos planetas no Sistema Solar.
ExcluirMas acho que você vai ser como um “advogado” tentando defender a teoria geocêntrica. Vou listar algumas vantagens da teoria geocêntrica, à época que houve o debate entre as duas, há cerca de quatro séculos! A teoria geocêntrica parecia ter mais vantagens em relação à heliocêntrica. Você pode usar esta lista para tentar defender a teoria geocêntrica, na escola. Vamos lá:
1. A teoria geocêntrica parecia fazer mais sentido que a heliocêntrica, porque todas as observações levavam a crer que os outros objetos celestes giravam em torno da Terra. É o que todos percebem olhando o céu: simples assim.
2. As pessoas (inclusive grandes pensadores da época) achavam que, se a Terra se movesse, deveriam perceber esse movimento. Mas ninguém consegue perceber a Terra se movendo (ninguém percebe a Terra se movendo sob seus pés...).
3. Como os objetos caem em direção à Terra, isso parecia indicar que ela seria o centro do universo conhecido à época.
4. O modelo geocêntrico conseguia prever os movimentos dos corpos celestes com grande precisão, aliás, com maior precisão que o modelo heliocêntrico. Logo, o geocêntrico parecia ser o certo.
5. Os astrônomos observavam movimentos retrógrados dos planetas (pareciam inverter o sentido do movimento, durante algum tempo), o que era explicado pela teoria geocêntrica. Logo, mais uma vez, ela parecia ser a teoria certa.
Não sei de qual série escolar você é, por isso escrevi de maneira bem resumida. Para mais detalhes, recomendo o livro que citei no texto: Big Bang, do autor Simon Singh. Espero ter ajudado.
PS: Publiquei novamente a resposta que havia dado em 26/10/2016.
me ajudou na minha lição, muito bom
ResponderExcluirOlá, fico feliz de saber que um texto de meu blog tenha ajudado no esclarecimento sobre estas questões, e no trabalho escolar de alguém. Sempre bom lembrar de citar as referências.
ExcluirQueria saber sobre a bíblia hoje teoria
ResponderExcluirHeliocentrismo
Não entendi qual seria a dúvida. Mas sugiro ler também o texto "Teoria Heliocêntrica × teoria Geocêntrica (2)", continuação deste, deve ajudar a esclarecer, pois tem citações para outras fontes também.
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