Caros amigos,
Última parte da reflexão.
Seguem trechos de documentos da Igreja que tratam sobre o presente
tema, com comentários quando for o caso. As abreviações FR e GS referem-se a Fides et Ratio e Gaudium et Spes, respectivamente:
“A fé e a razão (fides et
ratio) constituem como que as duas asas pelas quais o espírito humano se
eleva para a contemplação da verdade. Foi Deus quem colocou no coração do homem
o desejo de conhecer a verdade e, em última análise, de conhecer a ele, para
que, conhecendo-o e amando-o, possa chegar também à verdade plena sobre si
próprio (cf. Ex 33,8; Sl 27/26,8-9; 63/62,2-3; Jo 14,8; 1Jo 3,2).” (Fides et Ratio).
FR 48: “A razão privada do contributo da Revelação percorre
sendas marginais, com o risco de perder de vista a sua meta final. A fé privada
da razão põe em maior evidência o sentimento e a experiência, correndo o risco
de deixar de ser uma proposta universal. É ilusório pensar que, tendo pela
frente uma razão débil, a fé goze de maior incidência; pelo contrário, cai no
grave perigo de ser reduzida a um mito ou superstição. Da mesma maneira, uma
razão que não tenha pela frente uma fé adulta, não é estimulada a fixar o olhar
sobre a novidade e a radicalidade do ser.”
Amigos, nossa fé não se faz com uma maior evidência do
sentimento e da experiência (experiência no sentido que a Fides et Ratio destaca, no trecho acima). Certas coisas podem
despertar muito os sentimentos, as emoções; o que não significa
necessariamente, que seja algo útil à nossa fé; não vivemos somente de
emoções. Muito menos ainda, pode a nossa fé ser reduzida a mito ou
superstição...
Aliás, dizer que pesquisa em ciência básica é desnecessária, e
“desvia” dinheiro que poderia ser gasto para matar a fome dos outros, é
realmente um mito... como o é também, achar que a Igreja deveria vender “seus
bens”... Nossa fé nada tem a ver com mito.
FR 22: “...o Apóstolo [São Paulo] exprime uma verdade profunda:
por meio da criação, os ‘olhos da mente’ podem chegar ao conhecimento de Deus.
Efetivamente, por meio das criaturas, ele faz intuir à razão o seu ‘poder’ e a
sua ‘divindade’ (cf. Rm 1,20). Desse modo, é atribuída à razão humana uma
capacidade tal que parece quase superar os seus próprios limites naturais: não
só ultrapassa o âmbito do conhecimento sensorial, visto que lhe é possível
refletir criticamente sobre o mesmo, mas, raciocinando a partir dos dados dos
sentidos, pode chegar também à causa que está na origem de toda a realidade
sensível...”
FR 4: “Impelido pelo desejo de descobrir a verdade última da
existência, o homem procura adquirir aqueles conhecimentos universais que lhe
permitam uma melhor compreensão de si mesmo e progredir na sua realização. Os
conhecimentos fundamentais nascem da maravilha
que nele suscita a contemplação da criação(...) Parte daqui o caminho que o
levará, depois, à descoberta de horizontes de conhecimentos sempre novos. Sem
tal assombro, o homem tornar-se-ia repetitivo e, pouco a pouco, incapaz de uma
existência verdadeiramente pessoal.”
Sem tal assombro... o que seria de nós...?
FR 25: “ ‘Todos os homens desejam saber’1, e o objeto
próprio desse desejo é a verdade.”
1Aristóteles, Metafísica,
I, 1.
FR 21. “E a força para continuar o seu caminho rumo à verdade
provém da certeza de que Deus o criou como um ‘explorador’ (cf. Ecl 1,13),...”
Somos exploradores, e isto nos impele a desbravar o
conhecimento!
GS 36: “Se a pesquisa metódica, em
todas as ciências, proceder de maneira verdadeiramente científica e segundo as
leis morais, na realidade nunca será oposta à fé: tanto as realidades profanas
quanto as da fé originam-se do mesmo Deus. Mais ainda: Aquele que tenta
perscrutar com humildade e perseverança os segredos das coisas, ainda que disto
não tome consciência, é como que conduzido pela mão de Deus, que sustenta todas
as coisas, fazendo que elas sejam o que são.”
GS
15: “Participando da luz da inteligência divina, com razão pensa o homem
que supera, pela inteligência, o universo. Exercitando incansavelmente, no
decurso dos séculos, o próprio engenho, conseguiu ele grandes progressos nas
ciências empíricas, nas técnicas e nas artes liberais. Nos nossos dias,
alcançou notáveis sucessos, sobretudo na investigação e conquista do mundo
material. Mas buscou sempre, e encontrou, uma verdade mais profunda. Porque a
inteligência não se limita ao domínio dos fenómenos; embora, em consequência do
pecado, esteja parcialmente obscurecida e debilitada, ela é capaz de atingir
com certeza a realidade inteligível.”
GS 57: “...dedicando-se às várias
disciplinas da história, filosofia, ciências matemáticas e naturais, e
cultivando as artes, pode o homem ajudar muito a família humana a elevar-se a
concepções mais sublimes da verdade, do bem e da beleza e a um juízo de valor universal,
e ser assim luminosamente esclarecida por aquela admirável sabedoria, que desde
a eternidade estava junto de Deus, dispondo com Ele todas as coisas, e
encontrando as suas delícias em estar com os filhos dos homens”. (Cf. Prov
8,30-31).
Esse último trecho, realmente, é de
fazer arder o coração! Dissipa toda e qualquer crítica generalizada (e
infundada) à busca pelo conhecimento (destaco as ciências matemáticas e
naturais, mais afins à discussão presente).
Boa reflexão, e até a próxima.
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