sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Esse nosso mundo...

Amigos,

Como eu comentei na mensagem sobre os eventos que eu frequentei por estes dias, é sempre bom estar familiarizado com o que acontece na ciência básica, e como é bom quando aprendemos algo novo! No segundo evento do qual eu participei – uma palestra muito interessante sobre o bóson de Higgs – um ponto muito interessante foi explicado, que eu gostaria de comentar aqui no blog; dá uma boa reflexão, vocês vão ver.

A palestrante, que além de sua competência técnica, também tinha ótima didática, conseguiu expor temas bem complexos ao público em geral presente, de forma bem acessível. O público tratava-se (creio eu), em sua maioria, de estudantes de cursos da área de exatas: estudantes de física e engenharia – de graduação ou pós-graduação –, além de alguns professores. A palestrante, em dado momento, comentou sobre a “Quebra de Simetria” do bóson de Higgs ocorrida durante o resfriamento e expansão do universo. Calma! Não se assuste, não vá fugir do blog agora! Eu explico.

Abrindo um “parênteses” em meus comentários e reflexões sobre a palestra, gostaria de comentar antes algo sobre simetria. Bem, simetria nas formas de objetos é um conceito que já possuímos intuitivamente: um objeto possui simetria se, por exemplo, ao olharmos de diferentes ângulos, ele permanece com a mesma aparência; como uma esfera, que é vista sempre do mesmo jeito, se olhada de diferentes ângulos. Simetria, em física, significa que uma lei permanece a mesma, se algumas condições forem modificadas, como por exemplo: translação e rotação no espaço, e translação no tempo. Se montarmos um aparato em um lugar, e depois o movermos para outro local, ou se o girarmos no espaço, ele continuará funcionando da mesma forma; se o montarmos em outro momento (translação no tempo), idem. Mas não há simetria em relação a escala... por exemplo, se montarmos um objeto em uma escala reduzida, e depois tentarmos montar outro similar em uma escala maior, não funcionará da mesma forma... provavelmente desabará1. Fecha parênteses.

Durante a palestra, a professora explicou que, quando o universo era muito denso e quente, o bóson de Higgs apresentava simetria. Ela deu um exemplo bem didático sobre simetria, que eu partilho aqui: Suponha que seguramos um palito entre os dedos, comprimindo suas pontas; em princípio, há simetria, porque o palito parece o mesmo, se olhado de qualquer lado. Mas se forçarmos mais, o palito envergará... para onde? Não há como prever! Ele pode envergar para qualquer lado... mas uma vez envergado, perde a simetria... ele já não é visto da mesma forma, de diferentes lados... dizemos que houve uma “quebra de simetria”; o palito mudou para uma configuração de menor energia (guardemos isso). Fantástico, não? Explicação maravilhosa!

Bem, voltando ao bóson de Higgs, no início do universo, ele possuía simetria, significando que estava em um estado de maior energia (representado pelo cume da superfície mostrada a seguir, semelhante a um chapéu de mexicano). Mas durante a expansão e resfriamento do universo, o bóson de Higgs migrou para um estado de menor energia – de forma análoga ao palito que se enverga sob compressão –, perdendo a simetria. Essa quebra de simetria é representada pelo “deslizar” do bóson de Higgs do topo do “chapéu mexicano”, para uma posição qualquer na calha de sua aba (vide figura). Lembram da analogia do palito? Antes de se envergar, ninguém poderia prever para onde ele envergaria: poderia envergar para qualquer lado! Pois bem, algo similar ocorre com a quebra de simetria do bóson de Higgs: para qual ponto da calha da aba do “chapéu mexicano” o bóson “deslizaria”...? Poderia ser para qualquer posição! Impossível de prever também.



Bem... o bóson “deslizou” para uma posição em particular (agora já não há mais simetria); convergiu para uma dada região de menor energia. Nesta região particular, o universo adquiriu a configuração que tem hoje, tendo resultado no agrupamento de partículas subatômicas, e então de átomos, moléculas, poeira de gás, estrelas, galáxias... até chegar a nós! Nesta região em particular, o bóson de Higgs foi responsável por “dar” massa às partículas que efetivamente têm massa atualmente, como por exemplo os quarks – que formam os prótons e os nêutrons –, e os elétrons; e não a outras partículas, como o fóton – que é o corpúsculo de luz! Logo, as partículas constituintes da matéria possuem massa, enquanto a luz não.

Mas... e se o bóson de Higgs tivesse convergido para outra região de menor energia na superfície do “chapéu mexicano”...? O mundo não existiria, ao menos como o conhecemos... possivelmente as partículas subatômicas não teriam se agrupado e formado os átomos, estrelas, etc... imaginem se os quarks não tivessem adquirido massa, mas sim os fótons (a luz!). Nós não estaríamos aqui para nos questionar sobre os mistérios da natureza...

As pessoas falam em sorte: “por sorte, o bóson de Higgs convergiu para uma região favorável à evolução do universo, até culminar no que existe hoje, com tudo o que tem, inclusive nós!” Sorte...? Acaso...? O acaso criou tudo do jeito que conhecemos...? Não seria, como diz o Felipe Aquino, em seu livro “Ciência e Fé em harmonia”, querer se recusar a usar o nome de Deus, usando em seu lugar o nome “acaso”...?

Claro que esta discussão do parágrafo acima não necessariamente tem a ver com a opinião da palestrante; é uma reflexão minha. Isto me fez lembrar de outro conceito: “Princípio Antrópico”, o qual diz que tudo na evolução do universo parece ter sido finamente sintonizado para que resultasse do jeito que resultou; qualquer mínima alteração, e o mundo seria completamente diferente, e a vida provavelmente não teria surgido, e não estaríamos aqui. Mas isso fica para um próximo texto.

Espero ter aguçado a curiosidade de vocês! Vejam como é maravilhoso, conjugar a nossa fé com a razão!

Amigos, até a próxima!

Este texto foi baseado principalmente na palestra:
- Carla Göbel B. Mello, “Entendendo o bóson de Higgs”, PUC-RJ, Ago/2012.

Lembrando que as opiniões sobre as relações com a fé são minhas, não necessariamente desta autora.

Outras citações:
1Richard P. Feynman, Física em 12 Lições – fáceis e não tão fáceis, Ediouro, 2005.

2Felipe Aquino, Ciência e Fé em harmonia, Ed. Cléofas, 2004.


Para um breve “tour” sobre partículas, sugiro um texto da mesma autora da palestra citada acima.

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